Em uma sociedade que transforma tudo em espetáculo e ignora os clamores de adolescentes e jovens, não devíamos estranhar que o jogo da Baleia Azul fosse ganhar tantos adeptos capazes de tirarem a própria vida. Rosely Sayão nos ajuda a refletir sobre nosso descaso pelos recados que os adolescentes vivem nos mandando e sobre os suicídios que esse jogo bizarro tem provocado entre eles nesta época de crises identitárias. Texto disponível na Folha de São Paulo.
?As notícias sobre o jogo da Baleia Azul provocaram diferentes reações na sociedade. Primeiramente, elas colocaram na ordem do dia as reflexões e os debates a respeito do suicídio. Sabemos que o índice de suicídio vem crescendo no mundo todo, em todas as faixas etárias, em especial, entre os jovens e adolescentes. O Brasil segue essa tendência global e o tema costuma ser tratado como tabu, ou melhor, não costuma ser tratado. A polêmica em torno da "Baleia Azul", portanto, provocou pelo menos uma consequência produtiva: falar sobre o suicídio, um assunto tão inquietante e espinhoso, é bem melhor do que silenciar.
São diversas as razões que nos levam a evitar conversas a respeito desse tema, mas a principal delas é o receio de colocar o suicídio em evidência para os jovens e, sem querer, apresentar essa possibilidade como uma saída para quem vive um problema ? ou vários. Entretanto, o silêncio é ainda pior: é como se negássemos a existência dessa possibilidade, em vez de enfrentá-la.
Pois bem: logo após o primeiro impacto da Baleia Azul, que afetou famílias com filhos adolescentes, mudamos o jogo. Na internet, bem como nas rodas de amigos e conhecidos ? presenciais e virtuais ?, piadas e caricaturas do jogo começaram a mostrar uma outra face de nossas posições em relação aos mais jovens. Primeiramente, um chinelo de dedo com a tira azul substituiu a baleia e se propagou rapidamente pela internet, sugerindo que o que os adolescentes que se aproximam de jogos perigosos precisam mesmo é de castigo para aprender a viver.
Logo após esse "meme", surgiu um outro que, no lugar da baleia, mostra uma carteira de trabalho com o texto "É dessa baleia azul que os adolescentes precisam". Curioso como a ideia de trabalho se aproxima à de castigo, não é? Esses exemplos mostram o nosso despreparo para lidar com os adolescentes. Nós, que passamos a adolescência em um mundo com características diferentes do atual, ainda achamos que eles devem ser tratados como fomos ? ou como imaginamos que fomos. A maioria dos adultos não se lembra das angústias e inquietações que viveu nessa fase da vida e, por isso, trata com um certo desdém o sofrimento dos jovens.
Vamos relembrar: os adolescentes, no presente, sofrem uma pressão desmedida para que tenham sucesso escolar e pessoal, além de boa aparência, segundo determinados modelos; para que sejam populares; para que participem de determinados grupos sociais, e para que sejam felizes, muito felizes, porque damos "tudo o que não tivemos" a eles! E isso tudo é somado às inquietações de quem vive um momento de crise. Crescer dói. É preciso que lembremos sempre disso!
O que nossos jovens e adolescentes querem e precisam ? e que pouco temos ofertado ? é a nossa presença verdadeiramente interessada na vida deles. Precisamos desenvolver empatia e compaixão pelos adolescentes: tentar trazer para nós o lugar que eles ocupam nesta época da vida para nos aproximarmos deles com intimidade, sem, porém, invadir sua privacidade; para dialogar sem moralismos; ouvir com atenção e interesse o que dizem abertamente e aprender a ler o que dizem nas entrelinhas.
?Conte comigo sempre?. É essa a mensagem que cada jovem e adolescente precisa ouvir dos adultos, principalmente dos pais e professores?.
José Antônio dos Santos
Mestre pela UFSJ
Contato: joseantonio281@hotmail.com
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Escrito por Educação, no dia 12/05/2017