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Comunidade


Bebidas e drogas entre menores mancham bastidores do 7 de Setembro

Vendido a R$3 e com teor alcóolico três vezes mais forte que a cerveja, corote esteve entre as preferências; psiquiatra faz alerta




O desfile cívico de independência foi mesmo um espetáculo memorável. Por cerca de 9h, escolas e entidades mostraram a cidade o que todos nós queríamos ver: fatos históricos, belos lugares, valores e conquistas que nos orgulham de sermos lafaietenses. E para todo esse belo momento, rendemos sim os nossos mais veementes aplausos. Mas atrás dos palcos, pelas ruas adjacentes e esquinas, o que se viu foi algo bem preocupante. Jovens, em sua maioria, menores e adolescentes, fazendo uso de substâncias ilícitas e muita - muita bebida alcoólica mesmo. Além da já tradicional cerveja, vodka misturada com suco ou já saborizada e a bebida da vez: o Corote.
Em embalagem colorida, com aparência de suco e apresentação quase infantil, a bebida esconde um percentual alcoólico bem alto. Aliás, cerca de 3 vezes superior ao da cerveja. São 13,5% de álcool contra 4,2% a 5% das principais marcas. E ainda com um agravante. Fazendo um cálculo bem simples, cada embalagem da bebida equivale a 170ml de cachaça, vodka ou uísque – mais de um copo. E como o Corote tem sabor doce e agradável – e é barato, diga-se assim de passagem - o seu consumo acaba sendo bastante acelerado. E se uma pessoa toma, em 1h ou 2h, três garrafinhas, é como se ela tivesse ingerido meio litro de uísque, vodka ou aguardente em muito pouco tempo. É muita quantidade de álcool para o organismo absorver e tentar eliminar.
Quem viu o uso indiscriminado de bebidas na avenida se queixou: “Era gente muito nova. Alguns pareciam não ter nem 10 anos de idade. Na rua Du­du Nascimento mesmo, vi grupinhos se escondendo no meio do mato para usar drogas e para beber. Era de dar pena”, queixou-se uma denunciante. Tam­bém houve quem reclamasse da ausência do Comis­sariado da Infância e Juventude: “Em um evento desse porte, voltado para crianças e adolescentes, era de se esperar que alguém da Infância e Ju­ven­tude fiscalizasse. Não só para impedir que as crianças e adolescentes fizessem coisas erradas, como comprar bebidas em supermercados e tomar no meio da avenida, mas para proteger essas crianças. Acho que elas ficaram meio que jogadas”, destaca.

Comissariado da Infância não foi chamado para fiscalizar

Ouvido pelo Jornal CORREIO, o Comissariado da Infância e Juventude informou que, especificamente em relação ao 07 de Setembro, as notícias são de que a Prefeitura Municipal disponibilizou uma estrutura para que comerciantes, dos mais variados tipos, praticassem atividades de venda no local. “Não houve, no entanto, prévio aviso ao Setor do Comissariado ou à Vara da Infância e Juventude, o que impossibilitou fiscalizações sobre venda de bebidas alcoólicas no local, realizada por comerciantes ambulantes. Quanto à fiscalização fora de datas especiais, essa acontece de forma rotineira, com apoio da Polícia Militar e demais órgãos fiscalizadores, inclusive quando há denúncias realizadas junto ao setor. A frequência das fiscalizações é estabelecida de acordo com as necessidades do Setor e as demandas, em comum acordo com os demais ór­gãos responsáveis”, esclareceu.
O Comissariado lembrou, ainda, que existe penalidade para o comerciante que vende bebida alcoólica para menores. “A ação configura crime previsto no art. 243 do ECA, com pena de detenção de 02 a 04 anos. Além disso, ainda há lavratura de Auto de Infração lavrado pelo Comissariado da Infância e Juventude, nos termos dos artigos 81 e 258 “C” do ECA, que preveem Multa de R$3 mil a R$10 mil e medida administrativa de interdição do estabelecimento comercial até o recolhimento da multa aplicada. Não se aplica pena ao menor, mas aos comerciantes que cometem o crime ou aos pais que forem omissos, pois são eles efetivamente os responsáveis le­gais”, detalha. Qualquer cidadão que verifique o fornecimento de bebida alcoólica a menores deve acionar a Polícia Militar, via 190, a fim de possibilitar a prisão em flagrante daquele que comete o crime. Para comunicar os fatos ao Comissariado, a população pode se valer do e-mail: cnlcomissariado@tjmg.jus.br.

Psiquiatra alerta: pais não devem patrocinar o vício

Em sua avaliação, o médico psiquiatra Júlio Barros lembrou que a bebida está presente desde o início da história da humanidade como algo ligado à socialização e celebração. “No hábito de confraternizar, quando menos se espera, a pessoa se vê dependente, porque é uma substância psicoativa que modifica a célula neuronal, e uma vez modificada, ela necessita desse destilado. E no caso dos adolescentes e jovens, o efeito se torna ainda mais nefasto porque se trata de uma pessoa com o cérebro ainda em formação. Por isso, há influência na cognição e aprendizado. Além disso, a chance de que se estabeleça o vício é muito maior: Quando atendo uma pessoa de 30 anos com dependência alcóolica, ela responde que começou a beber aos 15. Isso em quase 100% dos casos. Quanto mais precoce, pior fica”, alerta.
Mas o que leva uma pessoa a dar o primeiro gole – e a continuar depois? A resposta está na percepção que algumas pessoas têm de que ‘beber é bom’. “Quem não bebe tem o conceito de que é ruim; de que faz mal. Mas quem bebe, não. A pessoa repete as doses porque aquilo está programado em seu cérebro como algo bom. A pessoa fica fora da realidade e se sente mais corajosa, desinibida e se socializa mais. Tem gente que fala claramente: se eu não beber, não vou naquele lugar. Então, busca na bebida a desinibição, melhora da timidez, coragem, capacidade de comunicação. E esse prazer se repete, porque se toda vez o efeito fosse negativo para ele, ele não usaria mais. O efeito do prazer promove a repetição”, explica.
O ambiente familiar também influencia. “En­quan­to há pessoas que têm trauma de churrasco, por se acostumarem a ver a carne sobrar e a bebida faltar, existem famílias que têm o estímulo para beber: fazem competição, reparam quem trouxe a melhor bebida ou se vangloriam com suas coleções de cachaça, por exemplo. Uma criança vendo isso, assistindo aos pais se vangloriando dessa capacidade que eles têm, de fazer uma viagem e trazer uma bebida como lembrança, com certeza é influenciada. Uma das formas de aprendizado é pela imitação”, acrescenta.
Uma vez estabelecido, o vício pode corroer a estrutura dos relacionamentos e deixar sua vítima no fundo do poço. “O álcool é, disparado, o que mais causa problemas de relacionamentos, abusos, traumas, rejeições, abandonos, separações e traições. Às vezes, o rapaz é acanhado, tímido, centrado e apaixonado pela namorada. Mas quando be­be, torna-se eufórico, expansivo e frequenta lugares que normalmente não frequentaria. Em uma ocasião dessas, trai a namorada. Ele se arrepende, pede perdão, pede para voltar, ela diz que não. E é aí que acontece um feminicídio. Há crises financeiras, demissões e desentendimentos que só aconteceram porque a pessoa estava alcoolizada”, alerta.

Como ajudar o seu filho?

Para os pais que percebem que o filho está caminhando para o vício, o primeiro passo, segundo o psiquiatra, é dar o exemplo, eliminando a bebida de dentro de casa. Logo depois, verificar de onde está saindo o dinheiro. “Os pais não devem patrocinar esse vício. Precisam saber falar não. E se há alguém por trás, bancando esse vício, os pais devem, de maneira sutil, impor limites”, ensina. E esse cuidado não deve ser deixado de lado com o início da maioridade: “É muito comum que os pais acompanhem os filhos quando são de menores, mas não os acompanhem mais quando se tornam maiores. E isso coincide com a chegada da fase de afirmação, aos 17, 18 anos, quando eles querem mostrar que não dependem mais dos pais; querem mostrar para os amigos que são donos de si. A bebida também entra nesse meio, como um símbolo dessa independência. Então, não baixe guarda”, aconselha.

E esse tal do Corote?

Para o psiquiatra, não há muita novidade na bebida, além da marca e industrialização. Mas é preciso estar atento. “É um destilado, como a vodka, mas com sabor. Mas, uma vez industrializado, você oferece o teor alcoólico menor. Daí a pessoa vai bebendo, aumentando a quantidade e, com isso, acaba perdendo controle. De qualquer maneira, a lei proíbe que o menor de idade consuma e os pais também têm que ter essa responsabilidade”, argumenta. Mas o psiquiatra faz ressalvas contra a apresentação do produto. “Assim como ligavam o cigarro à imagem de pessoas bonitas, felizes e saudáveis, enviando uma mensagem subliminar, essas embalagens bonitas têm seu poder de sugestão. Somos seres sugestionáveis e nada mais sugestionável do que a estética”, afirma.
Ainda segundo o psiquiatra, se a pessoa que está lendo esta matéria quer parar com esse vício, precisa começar enxergando seus limites, fazendo um exame de consciência e sabendo ouvir as pessoas que estão reclamando dela. Se falam que você ficou irritado, ignorante, que já não é mais o mesmo, entenda que dizem isso por bem. Admita, aceite a fragilidade, porque é a bebida que está provocando outra forma de agir e pensar”, finaliza.




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Postado por Redação, no dia 19/09/2019 - 09:05


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