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Educação


Mentalidades sobre currículo escolar



O currículo nas escolas tradicionais funciona com a mesma lógica de mercado. Os conteúdos são produtos a serem adquiridos pelo aluno, que é cliente consumidor. Quanto mais conteúdos repassados, mais as escolas são consideradas de qualidade. Mas isso tem um preço. 

Se perguntarmos à classe média e à elite quais são as escolas que mais preparam as pessoas, elas dirão que são aquelas que lhes oferecem muitos conteúdos, pois os formam para a vida. Formam mesmo? Para a vida? As escolas preparam para o mercado e garantem o status quo. Curiosamente, os clientes dessas classes sociais, mesmo entediados, estressados e esgotados com o tipo de currículo oferecido, raramente o questionam, pois sabem que os pais deles foram preparados da mesma forma. Essa mentalidade é principalmente identificada nas escolas particulares. 

Só que os tempos são outros. Os alunos até obtêm bons resultados nas avaliações oficiais na modalidade curricular tradicional, mas saem com uma cidadania quase sempre alienada e desajustada às necessidades e da vida social contemporânea. Eles não se conhecem, não conhecem suas habilidades sociais e cognitivas e estão perdidos na escolha profissional.  A mentalidade curricular oferecida por muitas escolas, apoiadas e legitimadas por muitas famílias e estudantes tem forçado um debate corajoso sobre essas questões.

Preciso deixar claro, aqui, que aprender conteúdos, saberes humanos locais e universais e ter um repertório de informações, nem que seja mediano, é essencial à vida acadêmica. Claro que as escolas precisam assegurar currículos com conteúdos. Porém, há umas questões intrigantes que estão incomodando mesmo os mais reacionários: Quais são os saberes necessários para a vida social contemporânea, marcada pela velocidade assustadora de reelaboração das relações de poder sociais, políticas e econômicas? A essa, seguem outras questões: Qual é o tempo de vida útil das informações transmitidas pelos professores? Qual é a utilidade dessas informações para a vida prática? Qual a contribuição, relevância e aderência das informações curriculares para solução de problemas reais da vida cotidiana? Qual é a importância do currículo tradicional dividido em disciplinas, quando as questões do Enem estão sendo elaboradas por áreas e de forma interdisciplinar? A mentalidade clássica de currículo não tem respostas claras para essas perguntas. Na verdade, não tem respostas.

Muitos adultos pensam que a aderência do currículo à vida real dos alunos depende da arte dos professores em saber transmitir conteúdos. A realidade tem mostrado que mesmo docentes criativos não conseguem esse sucesso, ou o fazem apenas de forma parcial. O maior desafio do educador está em conseguir que o aluno pense a informação, a processe e aprenda a reelaborá-la, para aplicar em situações inesperadas da vida social.  E as escolas não têm conseguido esse engenho a partir da mentalidade curricular cristalizada e ultrapassada. 

Há alguns anos, foi criado o eixo do Conteúdo Básico Curricular (CBC) para todas as disciplinas do ensino fundamental e médio. É de pasmar que muitas escolas, sobremaneira as públicas, não conseguem sequer cumprir o mínimo do CBC. Ele, que foi criado para assegurar uma flexibilidade do currículo, acabou por reforçar a mentalidade ultrapassada do currículo como mera transmissão da informação, mas dessa vez, reduzida. Ironia dessa concepção curricular.

Quando falo a leitores e pessoas da minha convivência sobre escolas que aplicam um currículo flexível de forma inovadora e que conseguem cumprir mais do que o conteúdo planejado, me perguntam se cumprem mesmo. E como são os resultados? E se isso funciona? Fica uma resposta. Estamos com pelo menos 20 anos de atraso social, cultural, tecnológico, científico, em relação ao desenvolvimento educacional dos países que construíram outras mentalidades curriculares. Eles têm obtido excelentes resultados nas suas avaliações oficiais e no exame internacional, o PISA. O que você acha? Funciona? 

Volte a atenção para o tipo de currículo padrão que temos em nossas escolas e tente responder: Funciona? Famílias e empresas estão felizes com os resultados? "Há um lado carente dizendo que sim e essa vida da gente gritando que não" (Maria Bethânia). Risos.

José Antônio dos Santos

Mestre pela UFSJ

Contato: joseantonio281@hotmail.com



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Escrito por Educação, no dia 03/06/2016




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